Tudo bem com a senhora? Espero que esteja bem, mas não bem de espírito, e sim bem rouca. Isso mesmo. Depois de ficar gritando das dez da manhã até as dez da noite, não poderia estar de outro jeito, poderia?
Noto que domingo foi um dia muito bom para você, para sua igreja e para as criancinhas crentes - que gracinha, não? - e ficaria muito feliz se para mim as 24 horas dominicais tivessem decorrido de forma análoga. Não decorreram. Por quê? Oh, você quer mesmo saber?
Por causa de você. Sim. Se não sabe, sou vizinha da sua igreja evangélica. Moro na casa logo a frente do prédio das suas atividades religiosas. Imagine agora que já está situada a seguinte ocasião: você, esguelando para os meninos e meninas de Deus, e eu, em casa, querendo assistir televisão. O volume está no número quarenta. Não, eu não sou surda. Quem é surda é você. Diga-me uma coisa: você aguenta sua voz estridente em casa depois que participa desses eventos?
Isto não é uma crítica (longe de mim!). Apenas gostaria de dizer algumas verdades que, decerto, a senhora não conhece. Sem mais delongas, vamos à elas.
Primeiro: Deus não tem problema algum de deficiência auditiva. A prova? Você lê a Bíblia, não? Ele não nos fez à sua imagem (imagem dele, não da senhora, pastora) e semelhança? Então. Nós temos dois ouvidos. É certo que alguns possuem problemas de audição (já pensou em fazer uma consulta com um otorrinolaringologista?*), mas Deus, Ele é perfeito. Logo, não é necessário berrar. Ele tudo vê, tudo sabe e tudo ouve (e bem). E se você foi algum dia ao teatro, viu que os atores não precisam de microfone - eles falam em bom tom e o auditório inteiro ouve. Não gritam. Então, se você quiser ser ouvida, vai ser.
Segundo: As crianças modernas não são mais tão inocentes quanto as crianças do seu tempo. Elas sabem atravessar a rua. Não existia a necessidade de fechar a rua com aqueles cavaletes gambetas que algum dos seus fiéis roubou da prefeitura. Eu sei, eu sei, eram muitas, mas os carros, que em sua maioria das vezes têm motoristas competentes e não-barbeiros, não iriam atropelar suas dóceis criaturinhas alienadas. Eles parariam. E se um estivesse em alta velocidade? Querida... Já viu gente andando em alta-velocidade no domingo? Só se for na Fórmula 1 (e olha lá: o Rubinho não é alguém que possamos chamar de rápido...).
Terceiro: Tenho plenos conhecimentos de que domingo é o dia de Deus. E também é o dia em que Deus descansou. Não sei se você já reparou, mas no domingo poucas lojas e serviços ficam disponíveis (só o supermercado, judiando de seus funcionários sem pagar hora extra). Sabe por quê? As pessoas estão descansando, assim como O Criador fez. Nada mais justo: cinco dias e meio trabalhando horas e horas a fio merecem uma boa pausa. E, me diga, como eu, estudante e futura vestibulanda, poderia repousar com a sua gritaria? Se você concluiu que não poderia, acertou, eu não repousei. Você arrancou de mim um direito, o direito de ficar de boa. Segundo Deus, temos que respeitar uns aos outros. Eu lhe respeitei, porém o sentimento não foi recíproco. Evangélica da gema, creio que não é do tipo que desrespeita as leis divinas. É pecado não respeitar.
Sintetizando: peço encarecidamente que evite ficar berrando aos domingos. Desligue as caixas de som, aposente o microfone e esguele só para quem estiver realmente interessado (esse grupo não inclui a vizinhança). Eu, você, a igreja, o mundo, todos nós seremos mais felizes. Até os mini-crentes. Eles vão chegar à adolescência com os ouvidos saudáveis!
Obrigada pela compreensão,
Lígia Berti Mozena - Autora do blog Vida Pirata
P.S.: Se a senhora não quiser compreender minha argumentação, cale a boca, puta arrombada, se não eu chamo a polícia e você vai se ferrar.